sábado, 5 de abril de 2008

John Hegarty, chairman da BBH em Londres

“A capacidade das agências no Brasil de planejar e comprar mídia é uma das grandes virtudes do modelo de comunicação brasileiro em comparação com o do restante do mundo.”

Essas não são palavras minhas, como pode parecer, mas sim de John Hegarty, chairman da BBH em Londres, Inglaterra, um dos dois mercados de comunicação mais desenvolvidos do mundo onde as agências, há um bom tempo, não têm mais a mídia dentro de sua estrutura.

Na Inglaterra, a questão do momento sobre o modelo de serviço de comunicação é a capacidade de implementar as idéias de maneira eficiente nos diversos canais. E a verdade é que com os birôs e as empresas de mídia, não apenas as agências e veículos perderam parte importante de sua relevância anos atrás, mas mais importante que isso: os clientes perderam a integridade das soluções de comunicação que agora querem mais do que nunca.

E, quanto maior for a fragmentação dos meios, maior será a fenda que expõe essa deficiência. Tudo porque a estratégia de mídia está, nesses mercados, cronicamente separada da estratégia criativa por uma barreira erguida originariamente por razões puramente comerciais.

Em outras palavras, lá e em vários mercados do mundo a agência detém a estratégia criativa, enquanto a chamada agência de mídia retém a estratégia de meios. E a única maneira de essas duas partes vitais do processo de comunicação se alinharem é por meio de reuniões a posteriori entre empresas fundamentalmente diferentes, com objetivos fundamentalmente diferentes, tentando ineficientemente ser complementares.

Os birôs e as agências de mídia – que são uma coisa só – surgiram, a bem da verdade, com a função de broker. A idéia foi acenar com uma “economia” para os anunciantes, à custa da concentração do poder de compra que permitiu espremer os veículos em negociações e limitou a atuação das agências, por tirar delas a possibilidade de elaborar a estratégia e a compra de mídia de sua própria criação.

Essa situação, inclusive, foi responsável em várias partes do mundo pelo enfraquecimento da diversidade empresarial no mercado publicitário. Como sempre, concentração de poder econômico só é bom para quem concentra.

Posteriormente, os birôs incorporaram a função de planejamento da mídia, tentando agregar valor ao serviço para, ao mesmo tempo, fugir da pecha de realizarem um trabalho puramente financeiro. Foram então incorporados pelos grupos de comunicação que também são donos das agências. Investiram em tecnologia para justificar sua atuação, vendendo a idéia de que teriam mais eficiência técnica que um departamento de mídia dentro de uma agência de propaganda, o que está longe da verdade no Brasil, onde os profissionais de mídia e a tecnologia aplicada são de primeira.

Mas, mesmo que assim não fosse, a suprema ironia é que as agências de mídia agora tentam colocar dentro de suas estruturas a capacidade criativa que já existe dentro das agências de propaganda. Ou seja: ensaiando um De Volta para o Futuro, querem se tornar o equivalente à agência, adotando o modelo que o surgimento delas comprometeu.

O que isso significa para o Brasil e o nosso modelo?
Significa que podemos evitar a grande burrada estratégica cometida anos atrás em “mercados supostamente mais adiantados que o nosso”, simplesmente não inventando de consertar aquilo que aqui não está quebrado.

O Brasil, que de tempos em tempos é oportunisticamente acusado de atrasado, por não criar condições para o estabelecimento de birôs ou agências de mídia, tem agora as razões mais atuais do mundo para não cair no jogo dos interesses unilaterais das multinacionais. Empresas que, sem grandes preocupações com o equilíbrio do ecossistema mercadológico do país em que estão, sempre pressionaram pela entrada de birôs alegando vantagens técnicas, quando na verdade querem, mais que tudo, a vantagem puramente financeira decorrente da possibilidade de negociar com os veículos numa posição de concentração de força.

Mas agora as coisas estão muito diferentes: enquanto estávamos “atrasados”, o mundo girou, girou e, porque mantivemos um modelo vencedor para o mercado, agora estamos à frente. À frente de outro modelo em que a distância entre estratégia criativa e planejamento de mídia já é admitida como causadora de um grave problema de eficiência na comunicação, esse sim um grande problema técnico.

Diante do novo cenário da mídia e da complexidade da geração de idéias para esse cenário, a desconcertante verdade é que mídia e criação têm que estar mais do que nunca juntas sob o mesmo teto. Esse modelo funciona melhor simplesmente porque permite que as soluções criativas nasçam integradas à estratégia de mídia na origem, como uma só coisa. E sem problemas de culturas e interesses conflitantes. É isso que pode proporcionar às empresas uma solução de comunicação genuinamente íntegra e integrada como elas procuram atualmente.

Como disse John Hegarty: “Se pudéssemos, voltaríamos a ter a mídia dentro das agências aqui na Inglaterra. Hoje percebemos que a única maneira de ser eficientemente criativos é tendo as duas coisas juntas, trabalhando juntas desde o princípio”.

Ou seja, não é porque o restante do mundo destruiu essa capacidade em seus mercados que vamos seguir o exemplo. Principalmente depois de saber que eles lá tentam voltar ao que temos aqui. Agir assim seria como tentar implementar o comunismo de Cuba, hoje. Ou como defender o direito de predar a Amazônia, agora em nome do progresso, só porque o restante do mundo fez isso com suas próprias florestas longo tempo atrás.

Existem duas maneiras de se aprender na vida e nos negócios.
A primeira é com os próprios erros. A segunda é com os erros dos outros. As duas ensinam coisas importantes. Mas a segunda é muito mais barata e inteligente.

Por Alexandre Gama, sócio e diretor geral de criação e planejamento da Neogama/BBH
Fonte: CCSP