quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Mais Kevin Kelly - "Novas Regras para uma Nova Economia"

Entrevista com Kevin Kelly, autor de "Novas Regras para uma Nova Economia"
O livro de Kevin Kelly, hoje traduzido para nove idiomas, é considerado leitura essencial para se entender o que está acontecendo na sociedade da Informação. Veja nesta entrevista como as previsões que Kevin fez em seu livro estão se concretizando e traçando o rumo da empresa em uma nova economia.

Mario Persona: Seu livro "Novas Regras para uma Nova Economia: 10 Estratégias Radicais para um Mundo Conectado" tem sido um guia para muitos que estão à procura de um rumo para suas empresas na nova economia. Considerando que foi escrito há alguns anos (um tempo longo para o relógio de Internet), e que as coisas estão mudando bem rápido, existe alguma correção que você faria hoje?
Kevin Kelly: Por incrível que pareça, não há nada que eu mudaria, mas há muita coisa que eu acrescentaria -- em sua maioria, muitos outros exemplos. Mas continuo acreditando naquelas regras. Acho que elas são hoje muito mais notórias e importantes.

Mario Persona: Sua idéia é de que a tecnologia não deveria ser usada apenas para gerenciar informações, mas deveria ser um meio para incrementar e cultivar relacionamentos. Com certeza ainda não chegamos ao ponto termos chips conectados por satélite implantados em cada pé de alface da horta, mas se existe algum passo inicial para um empreendedor na nova economia, qual você sugere que seja?
Kevin Kelly: Transformar, a maioria, ou mesmo todas, as suas transações em elétrons; o mais que puder. Ou seja, computadorizar tudo, e entender que não importa qual seja o negócio em que se está, ele tem a ver com software e comunicação. Pode-se conseguir serviços de intranet grátis na Web. Use-os.

Mario Persona: Seu livro fala do surgimento de uma rede global com pontos de controle descentralizados. A experiência do Napster tem demonstrado que esses "pontos de controle descentralizados" podem muito bem ser os grandes "players" usando o poder que conseguiram com as regras da velha economia. Como você enxerga o cenário para os próximos anos? Será esta batalha do velho contra o novo um evento transitório, ou será que isso irá definir a forma e as novas regras que irão efetivamente guiar a nova economia?
Kevin Kelly: Creio que as ponto.com são apenas a primeira onda, não o show todo. Atrás das ponto.com existe a verdadeira revolução, que é a de redes peer-to-peer de todos os tipos, como Linux, Napster e Ebay.

Mario Persona: Você acredita que a rede aumenta as conexões, as quais incrementam as oportunidades de crescimento. Em uma visão macro, a própria rede poderia agir como um "cérebro". Mas quando transferimos a idéia para o micro-cosmo de uma empresa em seu relacionamento com o mercado, descobrimos muitas empresas que criaram uma rede de relacionamentos, mas não conseguem identificar como utilizá-la para lucrar. Isso parece demonstrar que as conexões e redes não podem, por si próprias, fazer muita coisa se não tiverem um cérebro controlando-as. O que você pensa a respeito?
Kevin Kelly: Concordo. A idéia de que tudo o que você precisava fazer era simplesmente criar uma porção de conexões, e conseguiria com isto um cérebro, é chamada de "Conexionismo" em IA (Inteligência Artificial), e não funciona. Você precisa criar a conexão de uma forma inteligente, estruturada -- que é como nossos cérebros fazem na vida real. O mesmo vale para a Web.

Mario Persona: Você acredita que a tecnologia agrega valor à abundância ao invés de fazê-lo à escassez? Se assim for, será que isto seria aplicável a qualquer tipo de produto ou apenas à informação e coisas intangíveis?
Kevin Kelly: A questão é que o ÚNICO valor das coisas tangíveis está agora em sua parte intangível. O custo do ferro em um carro é de cerca de 100 dólares. O que você paga é pelas coisas intangíveis que dão forma àqueles átomos de ferro. Assim, todas as coisas irão seguir as leis dos intangíveis.

Mario Persona: Você parece acreditar que a aceleração do processo de inovação torna necessário abandonar aquilo que atingiu o ápice do sucesso, a fim de fugir da obsolescência. Como alguém saberia o momento certo para fazer isso? Kevin Kelly: Sempre que seus sucessos indicarem que deixar de lado está fora de cogitação ou será um desastre. A hora é essa. Você acaba escravizado por seus clientes atuais e seus desejos PASSADOS. Mario Persona: Se a turbulência acaba sendo a norma, você acredita que não exista muito futuro para as grandes empresas incapazes de acompanhar a velocidade das mudanças?
Kevin Kelly: Não, o que acredito é que existe abundância de novos espaços. Mas teremos muitas grandes empresas, de uma diferente forma de ser grande. Grande continua a ser uma necessidade para tornar eficiente tudo aquilo que funciona. O "grande" não está fadado ao desaparecimento.

Mario Persona: Você leu muitas das importantes obras de economistas, cientistas da computação e historiadores sobre a "nova economia". Quais foram os autores que exerceram maior influência em suas idéias?
Kevin Kelly: George Gilder, Peter Drucker, Hal Varian, Esther Dyson, John Barlow, Brad DeLong, Stuart Kauffman.

Mario Persona: Dar muitas coisas grátis tem sido uma experiência má sucedida para muitas empresas Web da primeira geração. Todavia, seu livro parece ensinar isso e não traça limites no modo de fazê-lo. Como um empreendedor iria identificar onde é a linha divisória, onde deve parar de aplicar a idéia do "dar grátis", antes que isto se transforme no suicídio de sua empresa? Kevin Kelly: Não concordo que dar coisas grátis tenha sido algo mau sucedido. A maioria dessas empresas NÃO TINHA A INTENÇÃO de ganhar dinheiro em seus primeiros anos; e não ganharam. Uma, que talvez seja a mais bem sucedidas empresas de todas as épocas, dá mais coisas grátis que qualquer outra -- a Microsoft. Portanto ainda é cedo para julgarmos a estratégia do dar grátis.

Mario Persona: Em uma espécie de "segundo round" das empresas Web, vemos investidores cansados de derramar dinheiro da "velha economia" em empreitadas de Internet não-lucrativas da "nova economia". Ao que parece, as empresas menores que não morrerem por si só, irão se consolidar em empresas maiores até que apenas uma meia dúzia de grandes empresas permaneçam. Será que isto poderá criar uma nova forma de controle para a nova economia de rede, com regras geradas por essas empresas enormes que estão sendo criadas.
Kevin Kelly: Como já disse, não acredito que o "Grande" esteja fadado ao desaparecimento. A consolidação é algo muito natural em redes, pois o que se deseja são grandes redes, e quanto maior melhor. (Este é o efeito "N ao quadrado", ou a lei de Metacalf). Acho que podemos esperar por uma consolidação cada vez maior dos conceitos existentes; na verdade este é um bom lugar para se apostar. Mas à medida que essa consolidação vai acontecendo, novos impérios do caos estão sendo criados (Napster, por exemplo) onde levará anos até que uma consolidação faça sentido.

Mario Persona: Em seu livro você escreve que "Na nova ordem, a inovação é mais importante que o preço". Poderia explicar isto melhor, agora que o lucro, e não a inovação, parece ser a principal preocupação dos investidores após o mau desempenho da primeira geração de empresas Web?
Kevin Kelly: Você não pode fundamentar suas vendas no preço, ou seja, só por ter produtos baratos. No fim isso é suicídio. Você só pode fundamentar suas vendas em inovações, em ter coisas que as pessoas nem sequer pensavam que iriam precisar. Ater-se ao preço apenas é uma rua sem saída.

Mario Persona: Você acredita que as alianças entre empresas estejam aumentando a inovação? Kevin Kelly: Sim, pois aprender como fazer alianças é algo tão novo, que exige inovação. Mais tarde pode ser que isto não aumente a inovação, mas agora com certeza está.

Mario Persona: Você cita autores de best-sellers, como também conhecidos economistas e futurólogos, mas não cita tantos exemplos de empresas e casos de negócios como vemos em outros livros. Creio que isto acontece por seu livro estar algumas milhas à frente da implementação dessas idéias. Agora que podemos ver ao menos um embrião daquilo que virá a ser uma economia totalmente interconectada, se tivesse que escrever um adendo ao seu livro, quais seriam as empresas que você acredita que estão tendo sucesso usando suas idéias? Kevin Kelly: Com certeza hoje eu promoveria alguns "case studies", mas a verdade é que eu poderia ter incluído mais deles quando escrevi o livro, porém deliberadamente escolhi não fazê-lo por duas razões: 1) Acho que isso desatualiza o livro rapidamente, e 2) me força a tratar do padrão que está por detrás disso, o que creio ser melhor que outros o façam.

Kevin Kelly

Estou relendo o livro Marketing na internet do Jagdish Shete, Abdolreza Eshghi e Balaji Krishnan, e logo no início eles já falam do Kevin Kelly, e então resolvi pesquisar alguns artigos do cara e achei este "Antigüíssimo", mas que vale a pena deixar aqui no Blog.

Um editor como você ligado ao que se designa por 'novas tecnologias', que dirige uma revista como a «Wired», tida como a bíblia dos 'seres digitais', a que propósito é que vem meter uma colherada na área da economia?
KEVIN KELLY - Por uma razão simples. Os títulos de primeira página estão a ser dados a essa tal revolução tecnológica, mas algo muito mais profundo está lentamente a mexer-se por debaixo disso. Dirigindo os ciclos de todas essas modas tecnológicas, está uma nova ordem económica emergente. Esta nova economia representa uma deslocação tectónica - se me é permitido usar a imagem -, um reordenamento ainda muito mais turbulento do que o que tem provocado o «hardware» digital.
Mas o que é que há de novo realmente nessa economia?
K.K. - Ela tem, a meu ver, três características distintivas - é global; favorece tudo o que é intangível (ideias, informação, saber e relações); e está intensivamente interligada. Estes três novos atributos estão a criar um novo tipo de mercado e de sociedade, baseado em redes eslectrónicas.
A 'rede', aliás, é considerada a metáfora central desta nova sociedade pós-capitalista emergente neste final do século XX. Mas as redes não existiram sempre ao longo dos tempos na sociedade?
K.K. - O que é diferente agora é que as redes, potenciadas e multiplicadas pela tecnologia, estão a penetrar nas nossas vidas tão profundamente que se tornaram no paradigma para o nosso pensamento e para a própria economia. O que nós criámos recentemente foram redes artificiais de enorme poder. A invenção destas redes é comparável às invenções financeiras da Veneza da Idade Média e à imprensa de Gutenberg.
Mas isso não se aplica só ao sector digital?
K.K. - Não. A premissa básica do meu novo livro é que os princípios que governam o mundo do «soft» comandarão, em breve, tudo o resto. Se você quiser visualizar o seu negócio no futuro, é melhor começar a imaginá-lo como algo construído inteiramente à volta do tal «soft», ainda que o veja, hoje, totalmente mergulhado no «hard». O que tem de fazer é saltar fora do casulo em que está habituado a pensar.
O seu ponto de vista é acusado de querer fazer tábua rasa de tudo o que havia antes...
K.K. - Nada disso. A nossa economia é uma amalgáma de diversas formas de comércio e de relações sociais. Veja o caso da troca directa. É uma das mais velhas formas de comércio, e não desapareceu. Ela passou através da primeira vaga agrícola, da segunda industrial e da terceira, e continua hoje. Muito do que acontece na World Wide Web é troca directa. E provavelmente continurá a ser mais importante, durante algum tempo, do que o próprio comércio electrónico.
Você refere que as comunicações não são, apenas, um mero sector económico, mais um. As comunicações são a própria nova economia, escreve no livro. Mas como é que se deu essa 'fusão' total?
K.K. - Veja o caso do dinheiro. Ele é, no fundo, um tipo de comunicação. E à medida que é cada vez mais 'libertado' da sua pele física por efeito da electrónica, mais se parece com outros tipos de comunicação. Agora estenda esta forma de ver as coisas ao resto da economia. Comunicações avançadas não são apenas computadores. Os computadores chegaram ao fim do caminho. Tudo o que poderíamos esperar dos computadores como máquinas isoladas já aconteceu. A grande ironia da nossa época, em que temos computadores por todo o lado, é que o valor não é criado pelas computações, mas pelas conexões.
Mas porque é que não chama à nova economia simplesmente 'economia digital' ou 'economia baseada no saber' como o fazem outros?
K.K. - Eu penso que necessitamios do modelo da rede para percebermos o que se passa. A ´rede' é como uma nova Mão Invísivel. Os seus princípios renunciam à rigidez, às estruturas fechadas, aos esquemas universais, à autoridade central, aos valores imutáveis. Se quiser, em termos filosóficos, a 'rede' oferece a pluralidade, as diferenças, a ambiguidade, o incompleto, a contingência e a multiplicidade. E tudo isto tem a ver com a forma como age a nova economia. A meu ver é como uma colmeia, provavelmente o melhor modelo natural de uma rede que é um sistema de pontos de controlo descentralizado. Tudo na nova economia é caracterizado pela descentralização da propriedade e do accionariato, por «pools» de saber em vez de «pools» de capital, por uma ênfase numa sociedade aberta.
Alguns economistas acusam-no de cometer o pecado capital ao colocar no centro da nova economia a abundância, quando a economia tem sido a 'ciência' do escasso...
K.K. - Uma das leis de que falo é efectivamente a da abundância. A informação tornou-se abundante e mesmo o conhecimento, apesar de ser mais escasso que a informação, se está a tornar abundante. Cada vez mais gente sabe de computadores, ou de redes, ou de inglês, por exemplo, e isso só torna tudo isso mais valioso. Mais dá mais.
Acha que a Europa está a acompanhar esse passo da 'invasão' de tudo pelas redes?
K.K. - Sou bastante ignorante sobre o estado da arte na Europa, mas penso que está a fazer o mesmo que os EUA fizeram, ainda que com alguns anos de atraso.
Um dos princípes criados pela riqueza que se desenvolveu a partir dos anos 70 é o patrão da Microsoft, apontado como o bilionário número um do mundo. Bill Gates é o seu símbolo para a nova economia?
K.K. - Para muita gente é. Contudo, não é o primeiro - nem será o último - a fazer uma riqueza incalculável a partir dos intangíveis. Quando Bill Gates passar à história, outro lhe ocupará o trono, e provavelmente não virá do negócio do software. Particularmente a história económica americana pode ser contada como uma série de indústrias que primeiro surgem como completamente desconhecidas e que depois passam a uma fase 'heróica', e que, durante um tempo, são tratadas como 'estrelas'. Depois outras vêm ocupar o lugar. É a lei da vida. Nada é harmonia, tudo é fluxo.
OS DEZ MANDAMENTOS DA NOVA ECONOMIA
1 -
A lei da colmeiaA vantagem competitiva: um sistema de controlo descentralizado
2 -
A lei dos rendimentos crescentesO mecanismo de aumento do valor económico: as conexões entre pessoas e coisas
3 -
A lei da abundânciaMais dá mais: a inversão do princípio clássico da escassez
4 -
A lei do tendencialmente gratuitoA formação dos preços também é invertida: antecipar o barato ou o gratuito
5 -
A lei da submissão à WebAlimentar primeiro a Web. Maximizar primeiro o valor na rede
6 -
A lei de antecipação do obsoletismoAbandone as galinhas de ouro antes que se tornem obsoletas pela entrada de outros
7 -
A lei do espaço de negócioO mercado deixou de ser um local físico, mas um espaço
8 -
A lei do desequilíbrioNão há harmonia, tudo é fluxo. A única saída é a inovação
9 -
A lei da tecnologia 'relacional'As únicas tecnologias com futuro são as que potenciam relações
10 -
A lei das ineficiênciasA exploração de novas oportunidades vem antes da optimização do que existe